A arte de se reinventar diariamente

A arte de se reinventar diariamente

Reinventar-se não é uma tarefa fácil. Exige coragem, vontade, energia. Às vezes a vida joga a gente de um lado pro outro, nos pega de surpresa e faz com que sejamos obrigados a tomar decisões que podem gerar impactos importantes para o nosso futuro. Que caminho seguir? Para onde ir?

Sim, eu sei que tem hora que o que a gente quer é só pedir para que o mundo pare de girar. Dá pra parar um pouquinho, só pra eu poder descansar? Mas ele não para e dá aquele nó na cabeça. E o que fazer?

Nesses momentos, em que tudo parece desabar, não há escolha mais sábia do que respirar. Respirar profundamente, sentindo o ar tomando conta de todo o corpo. E lembrar que toda tempestade, por pior que seja ou pareça, acaba. Não existe nada que dure para sempre, por pior ou melhor que seja. Nenhum inverno é eterno e todo verão também tem seu fim. Então, sejamos coerentes com a nossa essência. O primeiro passo para nos entender é tentar entender quem nós somos de verdade. Quais são os meus anseios mais primordiais? O que me faz realmente feliz? Eu tenho me feito essas perguntas diariamente durante alguns anos. Confesso que não é algo simples de responder. Mas acordar e me perguntar isso faz com que eu me coloque em prova diariamente.

Desde que comecei a me questionar, fui tomando mais consciência do que sou e do que busco. Do que me faz feliz. E a felicidade não é algo simples. Ao meu ver, a felicidade é algo bem complexo, pois envolve diversas variáveis. E é isso, estamos equilibrando pratos diariamente para fechar essa equação. Mas no final de tudo, você percebe que de todas as coisas que te fazem feliz, as mais significativas são as mais simples. Um abraço verdadeiro, um sorriso, um olhar com presença. E são esses detalhes, que, se somados, mudam por completo o curso de um dia ou transformam um problema em algo simples de se resolver. Portanto, no meu dia-a-dia, quando enfrento uma situação de estresse, tento me conectar comigo mesma e, após respirar profundamente, perceber o que de mas verdadeiro tenho dentro de mim. Fazer isso é ancorar-se em si mesmo. É buscar forças no que somos de fato, na nossa verdade. E quando encaramos a nossa verdade cara a cara, toda e qualquer reinvenção se torna viável, pois o externo passa a não nos amedrontar mais.

O medo que nos habita

O medo que nos habita

Foto por: Juliana França

Todos os dias eu acordo com medo. Basta abrir os olhos e já sinto o coração dar uma leve disparada. Onde estou? O que estou fazendo da minha vida? Como será o meu futuro? E percebo que sempre que penso no futuro o coração dispara. Sinto uma certa angústia. O tal medo que vem em forma de névoa. Aos poucos vou me repetindo que está tudo bem e não preciso me preocupar. O futuro é feito do presente, então vou tentando me concentrar no agora para dissipar a ansiedade. Respiro fundo, sinto o ar entrando e tomando conta do meu corpo. Sinto meus pés, pernas, braços, mãos. Penso em tudo o que posso realizar, tomo consciência do meu potencial. Agradeço. Me levanto.

De uns anos pra cá essa tem sido a minha rotina diária. O medo em quem escolhe um caminho não convencional também existe, afinal, o mundo nos coloca muitas obrigações e nos vende que precisamos ter seguranças no futuro. Quando você percebe, está vivendo em função do futuro e não do presente. Esquece de saborear a comida, de se abrir para os encontros que o acaso traz, de aceitar o novo, de se jogar no inesperado.

O medo vem e de nada adianta lutar contra ele. Todos os dias ele me acorda, mas eu aprendi a encará-lo de frente. A olhar bem fundo em seus olhos e me acolher. A medida em que eu fui entendo a sua existência e o aceitando em minha vida, eu percebi que ele foi ficando mais fraco. Não que ele tenha perdido força, mas o acolhimento que resolvi dar a ele fez com que nos tornássemos mais íntimos, pois eu passei a entendê-lo melhor. E por entendê-lo melhor, eu passei a me assustar menos.

Como lutar contra algo que é seu? A questão está em não lutar, mas acolher. Porque quando você acolhe, você abre espaço para entender e, então, mudar. Foi acolhendo o meu medo que eu descobri a coragem que tenho. O medo se transformou em força. A coragem de percorrer os caminhos desconhecidos, de aceitar o novo e celebrar a vida.

O meu medo não é maior do que a minha coragem, pois eles são a mesma energia. Então, agora, sempre que me desperto pela manhã e sinto medo, agradeço por ele estar ali. Pois ele me mostra o quão forte eu sou.

 

 

 

Juliana França trabalha com astrologia terapêutica, sob a visão humanista. Também tem estudos em psicanálise, psicologia junguiana e antroposofia. 

Endometriose e a liberdade perdida

Foto do projeto: Mulheres, arte e Endometriose por @sitah_photoart

Foto do projeto: Somos uma por @sitah_photoart

Tenho 31 anos e recentemente fui diagnosticada com endometriose profunda, ou grave ou sei lá o que. Resumindo, a minha probabilidade de ter filhos é praticamente nula ou perto dos -10%.

Acho que escutar isso foi uma das coisas mais difíceis pelas quais já passei na vida, mesmo eu, que nunca fiz grandes planos em relação à maternidade. É como enterrar uma pessoa que sequer chegou a existir. “Mas Juliana, você é uma mulher livre! Gosta de viajar, seguir seu coração. Você não nasceu pra ser mãe!” “Ah, mas a medicina hoje tá avançada. A Mariazinha da esquina tem endometriose e teve 2 filhos!” “Não fica triste não, você pode adotar!” Essas foram algumas das coisas que escutei. E cada vez que escutava alguém me dando um desses conselhos, me sentia ainda mais devastada.

Sim, eu sou uma mulher livre. Gosto de ir e vir, experimentar, provar o novo. E, justamente por ser livre, gostaria de ter a opção de decisão em relação ao meu útero. Uma coisa é decidir por não ter filhos. Outra coisa é ser sentenciada a não tê-los. E nada nunca tolheu tanto a minha liberdade quanto essa sentença, quanto a não compreensão das dores femininas, iniciando pelas cólicas profundas que eu sentia e negligenciava, por achar que era normal sofrer 4 dias por mês, todo mês.

A endometriose é uma doença séria e que vem afetando milhares de mulheres ano após ano ao redor de todo o mundo. É uma doença silenciosa, em que geralmente as mulheres descobrem quando já é tarde demais. A gente se nega atrás dos remédios para dores, das reuniões que não podemos perder, dos afazeres do dia que não podem ser adiados. Afinal, é normal sentir dor, é normal sofrer, é normal escutar das pessoas o que temos/podemos fazer da vida.

Minha querida amiga, a Mariazinha da esquina não tem um corpo como o meu. Eu sei que você não disse isso por mal, mas cada caso é um caso e a gente precisa entender isso para a endometriose sair dessa zona comum da ignorância.

Meu querido amigo, eu sei que posso adotar. Acho lindo, inclusive. E na ânsia de viver o meu feminino na sua maior potencialidade, adotei 6 crianças atualmente, as quais devoto todo o amor que eu nem imaginava que existia aqui dentro. Adoção, pra mim, é doação. E eu estou me doando por completo nessa minha fase de vida na qual busco pela minha cura. Mas amigo, não minimize a dor de saber que bem provavelmente eu não tenha a capacidade de gerar vida. Dói muito e talvez você nunca entenda.

Meninas, mulheres, amigas, primas, irmãs: não minimizem as suas dores. Jamais. Nenhuma delas. Chore, grite, sofra. Diga ao/a seu/sua chefe, ao/a seu/sua médico(a) que dói. Que você quer investigar melhor. Não se contente com um simples analgésico.

Pra mim, tudo isso só representa uma grande verdade que estamos vivendo nessa sociedade: somos viciados em analgésicos. Em soluções que tiram a dor, mas que não curam o problema. E o problema, amigos, está sempre dentro de nós. Escondido, mas pulsante, aumentando a cada dia. Por isso, escute-se. Investigue-se. Só você pode se salvar.

*Clique para saber mais sobre o projeto: Somos Uma

A dura arte de ser grato

Foto: Juliana França

Foto: Juliana França

Recentemente a palavra gratidão entrou na moda. No início eu confesso que até achei bacana, mas depois me pareceu algo banal, ‘gratidão’ virou o novo ‘eu te amo’. Fácil de falar, difícil de colocar em prática.

Tenho percebido como temos dificuldade em sermos gratos. Estamos sempre buscamos algo que ainda não temos, na esperança de que esse algo nos traga a satisfação plena, tão desejada. A questão é que sempre que atingimos um objetivo, vamos em busca de outro. É a falta, o famoso combustível da neurose, como já dizia Freud. Nada está bom, sempre precisamos de mais. Algo que também nos é inserido culturalmente, pela sociedade de consumo e nosso sistema capitalista. Afinal, o mundo precisa girar e, para isso, precisamos produzir e consumir.

Segunda-feira foi um dia duro. Uma tristeza tomou conta de mim, somada à saudade de estar longe de casa, do meu idioma, do meu país. Não é fácil ser imigrante. É aquela sensação de estar com um sapato que não te pertence. O pé tenta se ajustar e ao mesmo tempo se atrapalha nos passos. Mas caminha. Às vezes dói, faz bolha, como num sapato novo, que ainda não se ajustou ao seu caminhar. E essa sensação aparece não só quando se muda de cidade ou país. Ela surge toda vez que sofremos alguma mudança na vida. Não é fácil mudar, sair da sua zona de conforto, se adaptar ao novo. E segunda-feira foi um desses dias de bolha no pé, onde eu desejei fortemente calçar os meus sapatos antigos, já confortáveis e adaptados aos meus passos.

E onde entra a gratidão nisso tudo? Pois, voltando pra casa no fim do dia, falando com uma amiga por mensagens enquanto estava no metrô, percebia que ela, com a vida que eu desejava pra mim naquele exato segundo, também reclamava. Desejava mais isso e aquilo, como se ela já não fizesse e tivesse tanto. E foi falando pra ela sobre a gratidão e o tempo necessário para que as coisas amadurecessem, que me dei conta de que aquele discurso servia também para mim.

Temos sempre tanto, mas nunca olhamos para o que conquistamos. Nossos parâmetros e padrões sempre são externos. É aquela velha história de olhar a grama do vizinho, sabe? A gente se esquece de olhar o quanto caminhamos para chegarmos onde estamos. O quanto lutamos para conquistar qualquer coisa que seja. A vida do outro sempre parece mais interessante, os objetivos dos outros sempre parecem ser os mais certos a se seguir. E nessa toada vamos educando nossos filhos e a nós mesmos a buscarmos sempre mais e mais e mais. E não nos damos conta da preciosidade do que temos hoje. Não celebramos as nossas pequenas conquistas, a nossa coragem, a dádiva de mais um dia de vida.

Uma vez Lama Michel disse que rico não é quem tem muito, mas sim quem é satisfeito com o que tem. Isso me marcou profundamente. Ser rico é ser grato, é ser consciente dos nossos passos, das nossas conquistas, da nossa existência. E isso nada mais é do que viver o presente. É sentir o sabor da comida que nos alimenta, a presença de quem está ao nosso lado, o vento que sopra o nosso rosto, mostrando que temos vida.

Ser grato é perceber que temos aquilo que precisamos para o agora e que o futuro é apenas uma conseqüência do momento presente. É ser aberto à vida, aceitando os desafios que ela nos traz sem rejeição, mas com coragem para aprender o que quer que seja que tenhamos que aprender. E foi olhando ao redor que eu parei de desejar o que não tinha e me dei conta da preciosidade que é a vida. Percebi que mesmo não estando com os sapatos mais confortáveis, eu tinha a oportunidade de descobrir uma estrada completamente nova, com tempo para meus pés se ajustarem naquele novo sapato. Eu não precisava correr e nem voltar atrás em busca dos sapatos antigos. Bastava olhar ao redor e ser grata. Grata por ter conseguido chegar até aqui, gastando inúmeros sapatos e trocando de pares vezes outras. Com calos nos pés e dedos machucados, porém fortes. Podendo andar, adiante e firme. E foi, então, que percebi que estava tudo bem, que não havia razão para sofrer ou reclamar. Eu tinha tudo o que precisava para viver aquele momento, não precisava de mais nada. Fui tomada por uma gratidão imensa, afinal, estava tudo em seu devido lugar. E foi aí que me senti a pessoa mais rica do universo.

A generosidade de aprender a receber

 

Ratnasambhava

Ratnasambhava – o Buda da Generosidade

Quando falamos em generosidade, imediatamente associamos ao ato de dar algo a alguém. Aprendemos que ser generoso requer um certo desapego material, pois precisamos doar a quem precisa. Durante anos vivi com essa noção de generosidade e sempre que via alguém necessitado diante de mim, imediatamente me sentia na obrigação de ser generosa por sentir pena, por imaginar que deveria dividir, já que eu possuía tanto.

Sempre achei muito bonito isso de compartilhar com os outros algo que é meu. Ainda via a generosidade apenas como uma via de mão única, aquela velha história de partilhar o pão com os irmãos e alimentar a quem tem fome. O que eu não percebia, então, era que essa visão de generosidade ainda era muito arraigada de egoísmo e até mesmo de uma certa soberba. Nessa visão, a generosidade beira a arrogância: “Vou dar porque tenho muito e ele tem tão pouco, tadinho.” Olhando por essa perspectiva, colocamos o outro num lugar menor e nos colocamos num lugar de salvador, aquele que pode tudo. É algo bem sutil, mas que faz toda a diferença.

No budismo tibetano, o Buda que representa a generosidade é Ratnasambhava. Ele está sentado com uma das mãos em postura meditativa e a outra fazendo o mudra da generosidade, como na foto acima. Sua mão aberta simboliza a doação, mas também a receptividade, e é aí que reside a chave da verdadeira generosidade, que é, na sua essência, o antídoto contra a arrogância.

Quando nos sentimos auto-suficientes e superiores, não somos capazes de receber verdadeiramente. Podemos até doar, mas nossa doação será baseada na crença de que temos muito e que o outro tem pouco e nada a nos oferecer, portanto precisamos ajudá-los. Nesse caso, a palavra ‘pena’ cumpre um papel muito perigoso para o ato generoso, pois quando temos pena de alguém, imediatamente nos sentimos numa posição superior e daí não é a nossa generosidade que está atuando e sim a nossa arrogância.

Ser verdadeiramente generoso é estar completamente aberto à vida. É receber sem preconceitos, entendendo as nossas limitações. Todos precisamos de algo, afinal, somos seres que nos relacionamos. Fomos criados para dar (às vezes, nem isso!), mas quase nunca para receber. Já parou para perceber como é difícil receber um elogio? Sempre estamos em busca de um reconhecimento, mas sempre quando recebemos algum, sentimos que é pouco ou fazemos pouco caso. Outro dia me peguei fazendo isso quando elogiaram o meu cabelo. Imediatamente soltei: “Imagina, você está exagerando. São seus olhos.” Eu também já escutei muito de amigos (e até de mim mesma) a seguinte frase: “Adoro ajudar, mas odeio pedir ajuda.” Ora, o que não é isso senão arrogância? Arrogância também é não admitir que somos seres limitados, que também caímos e que precisamos de uma mãozinha de vez em quando. Não é errado demonstrarmos fraqueza, tristeza e qualquer tipo de necessidade. Mas como não queremos que o outro sinta ‘pena’ de nós, a gente se faz de forte e se obriga a ser de ferro. Que furada!

Meus últimos meses foram de muitos aprendizados nesse sentido. Me descobri uma pessoa extremamente arrogante. Sempre estava ali pronta para ajudar quem quisesse e precisasse, tinha uma incrível dificuldade em dizer não. Quando então entendi que aquela minha generosidade era uma fraude. Afinal, eu não sabia receber. Não entendia as minhas limitações, até mesmo a de dizer não. E foi aí que eu percebi a minha humanidade. Pois eu também sofro, também sou fraca, mas também estou rodeada de pessoas incríveis que se importam comigo, me amam e querem me ajudar de alguma forma. E daí me veio a clareza de que a generosidade se torna verdadeiramente completa quando olhamos para o mundo de forma equânime e nos libertamos da nossa arrogância, para receber com gratidão tudo o que a vida nos oferece, sendo capazes de retribuir com amor a todos e não somente aquele que julgamos que precisam, pois o fluxo da generosidade é bi-direcional: todos que dão, recebem algo em troca, de alguma forma. Precisamos apenas ter a clareza para perceber e receber isso.

Caminhar sem medo

Foto: Juliana França

Foto: Juliana França

Há exatamente um ano eu estava desembarcando em Paris com uma mala e muitas dúvidas. Estava completamente perdida, não tinha a mínima noção do que seria e do que queria que fosse o meu futuro. Era como se houvesse um abismo sob os meus pés, mas, por incrível que isso possa parecer, nada desesperador. Uma imensa calma me acompanhava, pois eu sabia que na hora certa e do jeito certo, as coisas iriam se ajeitar e a cabeça iria voltar para o lugar.

Queria passar meu aniversário em Paris, não pelo glamour, mas por uma simples intuição. E foi a melhor coisa que fiz. A temperatura ideal, com dias lindos e azuis, a cidade toda florida e um amigo Capricorniano também passando por um momento de mudanças. Lembro que no dia do meu aniversário acordei cedo e fui ajudá-lo a buscar umas araras do outro lado da cidade. Foram uns 40 minutos em 3 linhas de metrô, um castelo, várias praças, até descobrir que as araras não estavam lá onde ele esperava encontrá-las. Quando você não conhece a cidade, qualquer lugar vale a pena, qualquer passeio é uma nova descoberta. E talvez essa tenha sido a grande lição desse dia: o meu presente foi essa descoberta. Apesar da frustração de termos caminhado tanto para não alcançar o nosso objetivo, observei cada esquina, cada flor e a beleza revisitada daquele castelo que eu já conhecia de outros passeios. O caminhar, a companhia, o ser útil e as descobertas no meio do caminho, me fizeram ver exatamente o que a vida era e me fez perceber que não ter respostas não é um problema e sim, muitas vezes, uma solução.

Lembro que nessa semana que fiquei em Paris, levava um mapa sempre comigo, mas raras eram as vezes que o abria. De algum jeito e por algum meio eu chegaria em casa no fim do dia. Essa sensação de se perder na vida, sem muitos medos, é uma das melhores que se pode ter, principalmente se depois conseguimos aplicá-la no nosso dia a dia, nessa rotina maçante que vivemos. Foram 9 meses me sentindo completamente perdida, sem respostas e com todas as certezas sendo descontruídas. Sem casa, sem emprego, completamente fora da minha zona de conforto. A única coisa que eu achava que tinha como posse, era uma mala, algum dinheiro guardado no banco e um pouco de fé. Fé de que eu estava trilhando o melhor caminho que podia naquele momento e, justamente por estar vivendo um momento de total desapego material, pude ganhar com todo o resto que se apresentou ao meu redor. Ganhei em amizades, descobertas, sensibilidade e experiência de vida. Um ano se passou e eu me transformei totalmente.

Nesse dia do meu aniversário, depois que deixei meu amigo, fui dar uma volta em Montmartre e parei no Basílica de Sacre Coeur. Me sentei ali dentro, em silencio total, numa espécie de meditação. Uma senhora me entregou um papel, onde se lia: escreva aqui os seus pedidos. Não sou de pedir muito, além de felicidade, mas naquele momento escrevi três coisas naquele papel. Motivada por aquele momento, não sei se já era uma previsão do que estaria por vir, ou um profundo desejo, fiz aqueles pedidos do fundo do meu coração, me sentindo até um pouco egoísta por pedir algo num momento tão rico que estava vivendo, de profundo auto-conhecimento.

A viagem seguiu, outras vieram. Muitas coisas se sucederam nos meses que passaram e, finalmente, um ano se completou. Posso dizer que apesar de tudo, os últimos meses foram os mais ricos da minha vida, em todos os sentidos, inclusive financeiramente. Poucas pessoas talvez entendam verdadeiramente o que foi esse período para mim, talvez nem eu mesma entenda tudo isso em sua completude nessa pequena existência, mas esse deixar-se levar pela vida foi, sem dúvida, o maior de todos os aprendizados que já tive. As dúvidas foram se dissolvendo no tempo certo, demorou um pouco mais do que eu imaginava, mas fui me encantando pelas surpresas do caminho, tornando esse caminhar ainda mais belo. E os 3 pedidos feitos com profunda fé naquele 30 de agosto de 2013 foram atendidos, o último deles, nesta semana. E hoje tenho a consciência de que tudo isso só aconteceu, porque eu deixei que acontecesse, sem pressa e sem expectativas, no tempo certo, da maneira devida, sem interferir, aceitando tudo o que surgia com gratidão.

Eu sei que para o meu novo ano ser doce, só depende de mim. Eu só consigo tornar o meu redor um lugar melhor, se eu for uma pessoa melhor. O mundo não muda, o que muda é a minha forma de ver o mundo. Hoje tudo é diferente para mim, porque eu me tornei uma pessoa diferente, e se eu consigo enxergar o amor fora, é porque ele passou a existir dentro.