Caminhar sem medo

Foto: Juliana França

Foto: Juliana França

Há exatamente um ano eu estava desembarcando em Paris com uma mala e muitas dúvidas. Estava completamente perdida, não tinha a mínima noção do que seria e do que queria que fosse o meu futuro. Era como se houvesse um abismo sob os meus pés, mas, por incrível que isso possa parecer, nada desesperador. Uma imensa calma me acompanhava, pois eu sabia que na hora certa e do jeito certo, as coisas iriam se ajeitar e a cabeça iria voltar para o lugar.

Queria passar meu aniversário em Paris, não pelo glamour, mas por uma simples intuição. E foi a melhor coisa que fiz. A temperatura ideal, com dias lindos e azuis, a cidade toda florida e um amigo Capricorniano também passando por um momento de mudanças. Lembro que no dia do meu aniversário acordei cedo e fui ajudá-lo a buscar umas araras do outro lado da cidade. Foram uns 40 minutos em 3 linhas de metrô, um castelo, várias praças, até descobrir que as araras não estavam lá onde ele esperava encontrá-las. Quando você não conhece a cidade, qualquer lugar vale a pena, qualquer passeio é uma nova descoberta. E talvez essa tenha sido a grande lição desse dia: o meu presente foi essa descoberta. Apesar da frustração de termos caminhado tanto para não alcançar o nosso objetivo, observei cada esquina, cada flor e a beleza revisitada daquele castelo que eu já conhecia de outros passeios. O caminhar, a companhia, o ser útil e as descobertas no meio do caminho, me fizeram ver exatamente o que a vida era e me fez perceber que não ter respostas não é um problema e sim, muitas vezes, uma solução.

Lembro que nessa semana que fiquei em Paris, levava um mapa sempre comigo, mas raras eram as vezes que o abria. De algum jeito e por algum meio eu chegaria em casa no fim do dia. Essa sensação de se perder na vida, sem muitos medos, é uma das melhores que se pode ter, principalmente se depois conseguimos aplicá-la no nosso dia a dia, nessa rotina maçante que vivemos. Foram 9 meses me sentindo completamente perdida, sem respostas e com todas as certezas sendo descontruídas. Sem casa, sem emprego, completamente fora da minha zona de conforto. A única coisa que eu achava que tinha como posse, era uma mala, algum dinheiro guardado no banco e um pouco de fé. Fé de que eu estava trilhando o melhor caminho que podia naquele momento e, justamente por estar vivendo um momento de total desapego material, pude ganhar com todo o resto que se apresentou ao meu redor. Ganhei em amizades, descobertas, sensibilidade e experiência de vida. Um ano se passou e eu me transformei totalmente.

Nesse dia do meu aniversário, depois que deixei meu amigo, fui dar uma volta em Montmartre e parei no Basílica de Sacre Coeur. Me sentei ali dentro, em silencio total, numa espécie de meditação. Uma senhora me entregou um papel, onde se lia: escreva aqui os seus pedidos. Não sou de pedir muito, além de felicidade, mas naquele momento escrevi três coisas naquele papel. Motivada por aquele momento, não sei se já era uma previsão do que estaria por vir, ou um profundo desejo, fiz aqueles pedidos do fundo do meu coração, me sentindo até um pouco egoísta por pedir algo num momento tão rico que estava vivendo, de profundo auto-conhecimento.

A viagem seguiu, outras vieram. Muitas coisas se sucederam nos meses que passaram e, finalmente, um ano se completou. Posso dizer que apesar de tudo, os últimos meses foram os mais ricos da minha vida, em todos os sentidos, inclusive financeiramente. Poucas pessoas talvez entendam verdadeiramente o que foi esse período para mim, talvez nem eu mesma entenda tudo isso em sua completude nessa pequena existência, mas esse deixar-se levar pela vida foi, sem dúvida, o maior de todos os aprendizados que já tive. As dúvidas foram se dissolvendo no tempo certo, demorou um pouco mais do que eu imaginava, mas fui me encantando pelas surpresas do caminho, tornando esse caminhar ainda mais belo. E os 3 pedidos feitos com profunda fé naquele 30 de agosto de 2013 foram atendidos, o último deles, nesta semana. E hoje tenho a consciência de que tudo isso só aconteceu, porque eu deixei que acontecesse, sem pressa e sem expectativas, no tempo certo, da maneira devida, sem interferir, aceitando tudo o que surgia com gratidão.

Eu sei que para o meu novo ano ser doce, só depende de mim. Eu só consigo tornar o meu redor um lugar melhor, se eu for uma pessoa melhor. O mundo não muda, o que muda é a minha forma de ver o mundo. Hoje tudo é diferente para mim, porque eu me tornei uma pessoa diferente, e se eu consigo enxergar o amor fora, é porque ele passou a existir dentro.